Nota sobre julgamento de efeitos da coisa julgada em matéria tributária

No início do mês de fevereiro de 2023, o Supremo Tribunal Federal realizou julgamento dos Temas 881 e 885 vinculados aos Recursos Extraordinários 949297 e 955227, quando foi fixada tese no sentido de que “1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo. 2. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo”.

A referida decisão teve como principal fundamento a alegação de que contribuintes que possuíam decisões favoráveis transitadas em julgado acabavam descumprindo as regras da livre-concorrência de mercado, e que consequentemente, a solução mais adequada a este suposto problema, seria uma “harmonização” dos princípios da segurança jurídica e da igualdade. Porém, referida decisão resultou em grave violação a um dos institutos mais caros do ordenamento jurídico, a coisa julgada.

A Constituição Federal, em seu Título II, no rol dos direitos e garantias fundamentais, prevê expressamente no inciso XXXVI do art. 5º, que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada – que se caracteriza pela decisão judicial de mérito transitada em julgado e que, portanto, deveria trazer segurança àquele que buscou o poder judiciário para solucionar um conflito.

Assim, a coisa julgada é uma manifestação objetiva do princípio da segurança jurídica, pois garante a imutabilidade do que fora decidido dentro de um processo judicial, evitando que as discussões se eternizem, objetivando a estabilidade das relações jurídicas objeto da lide e da certeza dos atos estatais.

Protege-se não apenas a confiança depositada pelas partes na sentença definitiva, após o cumprimento do devido processo legal, como também a própria instituição judicante.

Sabendo disso, o que se percebe é que a problemática aqui traduz um conflito entre segurança jurídica e igualdade, ou coisa julgada e livre concorrência. As regras da livre concorrência de mercado reclama o tratamento isonômico entre competidores, portanto observância ao princípio da igualdade.

Ocorre que, há um perigo em se relativizar a coisa julgada, ainda que sob a justificativa de proteger a igualdade/ livre concorrência, principalmente por meio do Poder Judiciário, tendo em vista que se trata de um direito fundamental previsto expressamente em nossa constituição e com status de cláusula pétrea, ou seja, que não pode ser suprimida sequer por emenda constitucional, quanto menos por mera decisão judicial.

Assim, entendemos que a decisão proferida pelo STF traz enorme insegurança não apenas à coisa julgada em matéria tributária, mas a todo sistema processual diante da importância do instituto da coisa julgada no ordenamento jurídico brasileiro.

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